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Entremez do sapateiro surdo

Entremés famoso del zapatero sordo

Entremez do sapateiro surdo

Entremés famoso del zapatero sordo


Um Sapateiro
Um Velho
Hablan en él las personas siguientes:

Un Zapatero
Un Vejete
Um Cura
Joana
Un Sacristán
Juana
Susana, velha.
Sai o Sapateiro com os seus trastes.
Susana
Sale el Zapatero con recado de trabajar.
SAPATEIRO
Por mais que lide e travalhe
e ande sempre rebentando,
é impossível medrar
sem ũa molher ao lado.
Hei-de falar a Susana
ZAPATERO
Aunque un hombre se aprique
y ande siempre reventando,
es imposible medrar
sin una mujer al lado.
A Susana quiero hablar
segunda vez neste caso,
otra vez sobre este caso,
para que diga à sobrinha
para que habre a su sobrina
Juanilla la del hidalgo.
que sou bem afazendado,
bem criado, gentil-homem,
filho de pais muito honrados,
e que sou tam bem nascido
como el rei, telhas abaxo.
Mas a cousa de ser surdo
Mas esto de ser tan sordo
me faz dar a mil diabos,
que, a não ser tal, merecia
minha pessoa um bispado.
Ora Deos me dê boa sorte
me hace dar a dos mil diablos,
que si no, por mi persona
merecía un obispado.
¡Ah, Dios me dé buena dicha!
e m’ajude no travalho,
que a Susana há-de vir logo
em busca dos seus sapatos,
Ahora vamos trabajando,
que no ha de tardar Susana
en venir por sus zapatos,
e cuido que há-de trazer,
se acaso me não engano,
resolução da sobrinha
acerca deste noivado.
Assenta-se a coser. Canta.
y en viniendo, dentro o fuera,
habemos de echarlo a un lado.
Siéntase a coser, y canta.
Dizeis que me não queres
porque sou surdo.
Olhem no que repara,
não serei cornudo.
Fere-se com a sovela.
Arriba, garamandina,
arriba, garamandina,
escúcheme todo crudo.
Pícase con la lesna.
(fala)
Leve o diabo a sovela,
a torquês mais os sapatos,
porque me entrou a sovela
pelo dedo mais de um palmo.
Ora, tenho para peras!
Estou mui bem aviado,
é fermosa sovelada.
¡Y el alma que te crió
y el grandísimo borracho,
que a fe, a fe, voto a Dios,
que me he pasado una mano!
Al paño Juana y Susana.
SUSANA
¿No ves aquesto, Juanilla?
JUANA
Todo, tía, lo he mirado,
y me parece muy bien.
ZAPATERO
¿Si traeré yo aquí tabaco?
Deita tabaco no dedo. Sai Susana.
Saca un papel del seno.
SUSANA
Si a la lesna así la riñe,
se meterá en un zapato.
JUANA
También ella está culpada,
pues se va del pie a la mano.
SUSANA
¿Qué te parece del novio?
JUANA
No me parece muy malo.
SUSANA
Pues ahora vete a casa,
que yo quiero hablarle en tanto.
JUANA
A Dios, tía.
Vase.
SUSANA
SUSANA
            A Dios, sobrina,
que muy buen lance has echado.
Ella nunca ha de saber
que es sordo su enamorado.
Ahora bien, quiero llegar.
Deos esteja nesta casa
e me dê favor e amparo.
Senhor mestre, boas noites
Seor maestro, bien hallado.
lhe mande o Spírito Santo.
Hácele cortesías.
SAPATEIRO
Sim, senhora, não me pressiga
que ainda me falta acabá-los.
ZAPATERO
¿Qué ha de ser? ¡Voto a Dios,
que no sé cómo un cristiano
tiene paciencia!
SUSANA
Você, senhor mestre, é doido.
Eu não falo nos sapatos.
SUSANA
                       Ya empieza.
Que nada de eso te hablo.
Digo que mui boas noites
lhe manda o Spírito Santo.
De mais que trago a reposta,
é mui bem afortunado.
SAPATEIRO
Ta, ta, já entendo, está indisposta
pela falta dos sapatos.
SUSANA
Você não me entende a mim,
da noiva a reposta trago.
SAPATEIRO
Sim, senhora, com a sovela,
ZAPATERO
Sí, señora, con la alesna,
y entró más de tanto clavo.
SUSANA
¿Quién te dice nada de eso?
passei o dedo, té o cabo,
ate aqui, por vida sua,
se acaso traz algum trapo.
ZAPATERO
¿El hueso? Todo hasta el cabo.
Ate usté, por vida suya,
si acaso trae algún trapo.
SUSANA
Atarei. O meu recado
(ata-lhe o dedo)
ao ouvido lhe direi.
SUSANA
Sí haré. Direle al oído
lo que con Juana ha pasado.
SAPATEIRO
Não importa que aperte pouco,
mais vale bem apertado.
ZAPATERO
No importa que apriete usté;
más vale que esté apretado.
SUSANA
Eu já falei com Joana.
SUSANA
Mira que he estado con Juana
y acerca de ti la he hablado.
ZAPATERO
¿Salvado?
SUSANA
                ¡Juana!
ZAPATERO
                         ¿Mañana?
¡Norabuena! ¡Por mí, vamos!
SUSANA
Con Juana, digo.
SAPATEIRO
Que reposta lhe tem dado?
ZAPATERO
Ya entiendo.
¿Y qué tenemos del caso?
SUSANA
Diz que dará por bem tudo
o que eu fizer neste caso,
mas, contudo, quer um moço
que seja bem estreado,
bem criado, bem nascido,
bem provido, bem bizarro,
gentil-homem na presença,
muito bem afazendado,
para que vivam contentes
ambos de dous com descanso.
Diz mais que não quer que tenha
sezão algũa ou desmancho,
e que se não for assim nisto
não tomará tal estado.
SUSANA
Que dice que la respuesta
dará luego de contado.
¿Entiendes?
ZAPATERO
            ¿Que está indispuesta?  
Pues dígame, ¿qué la ha dado?
SUSANA
¡La respuesta!
SAPATEIRO
Pois que diz essa senhora?
ZAPATERO
                  ¡Ah!, ya lo entiendo.
¿Y qué tenemos del causo?
Que não tomará estado?
Ela sabe que sou surdo?
SUSANA
Que luego te quiere hablar.
ZAPATERO
Eso no me da cuidado,
porque soy tan bien nacido
como el rey, de arriba abajo.
SUSANA
Não lhe dê isso cuidado,
cale-se, não se amofine,
que há-de ter lindo despacho,
e o que eu passar com ela
o avisarei de contado.
SUSANA
¡Ay, qué sordera, señores!
Él es sordo temerario.
A Dios; con lo que dijere,
vuelvo luego de contado.
Fique com Deos, sobrinho.
Vá-se.
Vase.
SAPATEIRO
Não mereço favor tanto.
ZAPATERO
Esa es merced que usté me hace,
que no merezco yo tanto.
Foi-se. Pois vou acabar
ao padre-cura os sapatos,
mas não sei se poderei
Ahora bien, quiero aderezar
del sacristán los zapatos.
No sé si podré muy bien
coser com este chumaço.
coser con aquesta mano.
Sai o Cura.
Siéntase y canta. Sale el sacristán.
CURA
Boas noites, senhor mestre.
SACRISTÁN
Buenos días, seor maestro.
SAPATEIRO
Sim, senhor, com eles ando.
ZAPATERO
No, señor, que en ellos ando.
CURA
Que tenha boas noites,
SACRISTÁN
Que tenga muy buenos días.
senhor mestre, é o que falo.
SAPATEIRO
Tenho tido que fazer,
ZAPATERO
No he podido remediarlo,
porque he tenido qué hacer;
por isso estão neste estado.
vuelva usté desde aquí a un rato.
CURA
Eu entendo que você
é bêbado ou parvo
ou pertende burlar-me,
assim como quem quer alhos.
SACRISTÁN
Hombre, que no digo eso.
SAPATEIRO
Diz vossa mercê mui bem,
ZAPATERO
que foi milagre aprovado,
porque se toca no nervo
lá vai a mão c'o diabo.
¿Cómo que no fue milagro
de Dios? Si topa en el niervo,
volaba toda la mano.
SACRISTÁN
¿Hay sordera como aquesta?
Hombre, ¿estás dado a los diablos?
CURA
Eu suponho que você
que me pertende dar chascos.
Diga-me, sô carambola,
você é surdo ou é asno?
SAPATEIRO
Sim, senhor, com a sovela,
passei a mão mais de um palmo,
mas vedou logo o sangue
porque lhe deitei tabaco.
ZAPATERO
¿Con la alesna? Sí, señor,
y entró más de tanto cravo.
SACRISTÁN
Hombre, por Dios que parece
que tiras a darme chasco.
ZAPATERO
Sí, señor, todavía escuece,
porque le he echado tabaco
y me hace reventar.
CURA
Ora, você é capaz
SACRISTÁN
de tentar um santo.
Tú harás reventar a un santo.
Viva Cristo que me dão
tentações de trasfegá-lo.
SAPATEIRO
Diz vossa mercê muito bem,
já vejo que está descalço,
descanse, porque os terei
ZAPATERO
Descuide usté, que estarán
pela menhã acabados.
para la tarde acabados.
CURA
Há quem tal possa sofrer?
SACRISTÁN
¡Acabado estés tú y tu alma!
Sordo, loco, endemoniado,
¿quién diablos te ha de esperar?
Levanta-se o Sapateiro.
SAPATEIRO
Já sabe que eu caso?
Quem lhe disse esse negócio,
que ainda falta ajustá-lo?
ZAPATERO
Ya los llevará el muchacho.
CURA
Que desatinos são estes?
Este homem é o diabo,
haverá ou pode haver
no mundo todo tal asno?
SACRISTÁN
¿Otra? Por Dios que me dan
tentaciones de matarlo.
SAPATEIRO
Lá foi a tia falar-lhe,
e se ficar ajustado,
até sete de Setembro
mandarei buscar os banhos.
ZAPATERO
En eso tiene razón;
ya veo que está descalzo.
CURA
Aqui temos outra loucura,
o homem está enfeitiçado.
SACRISTÁN
¿Dígote yo nada de eso?
Hombre, ¿tú eres maza o mazo?
Levántase el zapatero riyéndose.
SAPATEIRO
Sim, senhor, senhor padre-cura,
será por força de estado.
ZAPATERO
Pues ¿quién se lo ha dicho a usté,
si no está en hora ajustado?
SACRISTÁN
Él dice mil desatinos.
Hace que se va.
Déjame, hombre de los diablos.
ZAPATERO
Allá está su tía a eso,
y si lo deja ajustado,
el lunes, a más tardar,
enviaré por los despachos.
SACRISTÁN
Aquesta es otra locura,
el hombre está rematado.
ZAPATERO
Sí, señor, el señor cura
será fuerza desposarnos.
CURA
Ora, o homem é bonito,
ainda o não vi mais asno!
Fique-se com Bersebú.
SACRISTÁN
¡Quédate con Bercebú!
SAPATEIRO
Ele o guarde muitos anos.
E se falar com Joana
ou a tia neste caso
diga-lhe que sou um moço
filho de pais muito honrados,
ZAPATERO
Él guarde a usté muchos años.
Digo, si usté está con ella,
dé una puntada en el caso:
dígala que soy buen mozo
y de padres muy honrados.
que venho por linha recta
de casa de Heitor, o Mago,
de Júlio César e Elias,
de Aníbal de Cartago,
do Valeroso Alexandre
e do português Veriato,
como também descendente
do grande poeta Horácio,
de Ovídio, de Platão,
de Ovídio, Cícero, de quantos
celebrou a antiguidade
com seus versos laureados,
e diga-lhe, finalmente,
que por matar Carlos Magno
aprendi a sapateiro,
por andar mais disfarçado.
CURA
Que disfarces ou que figas?!
Homem, tu deves ter o diabo,
que te não posso sofrer
embustes tão temerários,
e assim por te não ouvir
antes quero ir sem sapatos.
Vá-se.
SACRISTÁN
Por no escucharte me iré,
aunque me ande sin zapatos.
Vase.
SAPATEIRO
Apostarei que vai ele
dizer-lhe que eu sou fidalgo,
e por me não enganar
vou atrás dele escutá-lo.
Vá-se. Sai Joana.
JOANA
Triste de quem não tem pai,
que não há pior bocado,
porque não tem quem lhe sirva
de consolação e amparo.
Haverá quasi dous anos
esta dor me tem matado,
esta pena que atormenta
com este tremendo bocado,
e o que mais mal me trata
e priva do meu descanso
é querer, com muita pressa,
minha tia dar-me estado
com um homem que não vi.
Não sei se é coxo, se manco,
se corcovado ou potroso,
se simples, torto ou cobarde,
somente me diz que é rico
e que faz lindos sapatos,
mas que riqueza há-de ter
um sapateiro engraxado?
Pois se tiver ele algum
destes achaques que falo
quem há-de haver que deseje
tomar semelhante estado?
Rezão por que agora venho
a ver se acaso o topava
nesta casa para ver
se é capaz de meu agrado,
mas como sou infeliz
sempre me saiu a sorte em branco,
foi frustrada a deligência
que fazia para achá-lo,
motivo porque me vou
a minha casa chegando,
antes que em minha ausência
se possa fazer reparo.
Vá-se. Sai o Sapateiro.
SAPATEIRO
Leve Barrabás o cura,
porque tenho caminhado
mais de seis léguas e mea
sem já mais poder topá-lo,
pois eu levava os ouvidos
abertos mais de dous palmos,
que nada me escaparia
ainda que falasse baxo.
Mas já que o não topei
quero-me pôr ao trabalho
para despachar um velho
que também cá tem sapatos.
ZAPATERO
No tiene usté que volver;
ya los llevará el muchacho.
¡Famoso es el sacristán!
Él me hace mil agasajos.
Yo apostaré que va ahora
y que la mete en los cascos
que soy acá y acullá,
hasta dejarlo ajustado.
¡Ah, Dios me dé buena dicha!
Ahora bien, voy trabajando,
despacharemos al viejo
que tiene acá sus zapatos
días ha y temo que venga
a ver si están acabados.
Senta-se e trabalha. Sai o velho.
Siéntase a coser, canta y sale el Vejete.
VELHO
Deos guarde sua mercea.
VEJETE
Servitor, seor maestro.
SAPATEIRO
Aqui se vão acabando.
ZAPATERO
Aún no he hecho más que tomarlos.
VELHO
Não peço agora sapatos.
SAPATEIRO
Assente-se um bocadinho,
que logo vai despachado.
VEJETE
Oiga el hombre: buenos días,
que ahora no pido zapatos.
ZAPATERO
Siéntese usté un poquitico;
verá cómo lo despacho.
VELHO
Que diz, bêbado vilão?
Parece que me dá chascos.
VEJETE
¿Qué dices, sordo maldito?
Parece que me das chasco.
Peço-lhe, por vida sua,
me não fale atravessado
se não quiser que depressa
lhe faça a cabeça em quartos.
SAPATEIRO
Pois se entra por outra parte
lá vai a mão mais o braço,
olhe que ponta ela tem.
ZAPATERO
¿Que les eche un taconcito? 
Norabuena, de contado;
aunque harta falta me hace
el tener así la mano.
VEJETE
¿Hay sordera más terrible?
El hombre está rematado.
ZAPATERO
Pues si entra por otra parte,
volaba toda la mano,
porque miré usté qué punta.
VELHO
Não teve você fortuna
entrar-lhe té o espinhaço
a sovela, viva Cristo,
surdo, louco e temerário.
VEJETE
¡Mala punta en tu espinazo
se despunte, plegue a Cristo,
sordo, loco temerario!
SAPATEIRO
Boticário? Não, por certo,
eu me curei com tabaco.
ZAPATERO
¿El boticario? No, cierto;
yo me curé con tabaco.
VEJETE
Hombre, ¿quieres apurarme?
¿Quieres callar y dejarlo?
ZAPATERO
¡Si digo que no he podido!
Ya los llevará el muchacho.
VELHO
Senhores, melhor é
não fazer disto reparo,
VEJETE
¡Vive Dios! Mas mejor es
el no hacer de aquesto caso.
que, se se o fizera, viva Deos,
que lhe tinha aberto os cascos.
Ea, trabajad con brío,
que aquí os estoy aguardando.
SAPATEIRO
Pois diga-me, quem lhe deu
ZAPATERO
¿Luego a usté ya se lo han dicho,
notícias deste contrato?
Quem lhe disse que eu estava
com Joana apalavrado?
(levántase riyendo)
que no está en hora ajustado?
Mas tengo esperanza en Dios
tendrá buen defecto el caso.
VELHO
Peço pelas cinco chagas
VEJETE
Hombre, por las cinco llagas,
que me dexes com tais chascos,
que depois que aqui entrei
que me dejes con los diablos;
que después que aquí he venido
me tens com asneiras derreado.
pienso que me has infernado.
SAPATEIRO
Pois grã mercê me fará
se meter a mão no caso.
ZAPATERO
Pues usté me hará merced,
que si usté mete la mano
en ello, tengo por cierto
que ha de quedar ajustado.
VELHO
Fazes-me casamenteiro
como se eu fora Pilatos,
que a troco de não ouvir-te
me irei daqui sem sapatos,
que perco a paciência
e te hei de romper os cascos.
VEJETE
¡Casamentero me hace,
por la mitra de Pilatos!
Hombre, a trueque de no oírte,
me iré, aunque ande sin zapatos.
SAPATEIRO
Bem vejo que anda descalço,
e diz vossa mercê muito bem,
e se falar com Joana
diga-lhe lá o que sou.
ZAPATERO
No tiene usté que volver;
ya los llevará el muchacho.
VEJETE
¿Mas que pierdo la paciencia
y te doy cuatro mil palos?
ZAPATERO
Muy bien dice usté en eso,
ya veo que anda descalzo.
Mas mire usté una palabra.
VEJETE
Déjame, hombre. ¿Hay tal pelmazo?
ZAPATERO
¿Conoce usté, ultra de eso,
que ella gusta?
VELHO
Por São Paulo!
Puxa pela farrusca.
Que se não for deste modo
VEJETE
                   ¡Por san Pablo,
que si no es de aqueste modo,
não poderei soportá-lo,
no he de poder remediarlo!
oh salvagem fementido!
Dale.
SAPATEIRO
Oh, falso, traidor, velhaco.
ZAPATERO
¡Ay! ¡Valga el diablo su alma!
VELHO
Fica assim, birbantão.
Vá-se.
VEJETE
¡Jesús, y qué mentecato!
Vase.
Sai Susana.
ZAPATERO
¡Oh, valga el diablo al vejete,
y qué agudo que es de manos!
Él la debe de querer
cuando tanto le ha enfadado,
que yo no le he dicho cosa
que haya podido enojarlo.
Pues, por Cristo, que…
Sale Susana.
SAPATEIRO
Vá-se embora, sô puxado.
SUSANA
Que fazeis? Que sobressalto
tomastes? A noiva a vesitar-vos
[SUSANA]
                                         Lorenzo,
¿oyes? Apriesa, volando,
ponte la capa, que viene
chega logo e aí vem.
SAPATEIRO
As rezões foram com um velho
que, por pouco, o não mato.
la novia hablando del caso.
ZAPATERO
¡Ahí ha sido con un viejo,
que por poco no le mato!
SUSANA
Digo que aí vem a noiva
e traz um lindo despacho.
SAPATEIRO
Isso mesmo é o que eu digo,
que é que estava borracho.
SUSANA
Despacha; no digo eso.
ZAPATERO
¿Cómo qué? ¿Pues no alzó un palo
y me dio dos o tres muertos?
SUSANA
¡Ella trae lindo despacho!
ZAPATERO
Eso mismo digo yo:
claro es que estaba borracho.
SUSANA
Digo que aí vem a noiva
para fazer o contrato.
SUSANA
Quiero llegar al oído.
Mira que ya está esperando
la novia.
ZAPATERO
             ¿La noria?
SUSANA
                               No.
La novia está esperando.
SAPATEIRO
A noiva é? Já entendo,
pois tem algum embaraço
ZAPATERO
¿La novia? Ah, ya lo entiendo.
¿Y qué tenemos del causo?
SUSANA
Que está a la puerta.
ZAPATERO
                                ¿Está  muerta?
Se muere por mis pedazos.
Pero digo: ¿si conoce
e sabe que eu que sou surdo?
que soy sordo con mil diablos?
SUSANA
Mira: para todo hay maña.
ZAPATERO
Hable usté un poco más alto.
SUSANA
A conta lhe tenho dado,
você lhe há-de dizer,
em ela aqui chegando:
SUSANA
Para que no lo conozca,
escucha lo que he trazado
y ten cuenta que ha de hablarte
todo lo que aquí te hablo.
Lo primero te dirá:
«boas-noites» de ordinário,
e logo se lhe perguntar
«que fazenda tem, que anos,
de donde sois natural?»,
responda-lhe com cuidado
e diga-lhe que um bom vestido
fará para desposado.
Olhe se tem entendido
como aqui dou o recado.
«Buenas tardes» –lo ordinario.
Luego te ha de preguntar:
«¿Qué hacienda tienes? ¿Qué años?
¿De dónde eres natural?»
Y responder con cuidado,
y luego que un buen vestido
la harás para desposaros.
Mira si lo has entendido
como lo he dicho.
SAPATEIRO
Para isso do matrimónio
tenho eu ouvido largo,
de modo que hei-de dizer
primeiramente em chegando
ZAPATERO
                           ¡Mal ajo,
que a esto del matrimoño
tengo el oído tan largo!
De modo que lo primero
me ha de decir, en llegando:
«boas noites» e despois
que fazenda e que anos,
de donde sou natural,
e logo como me chamo,
e que faço um bom vestido
«Buenas tardes»; y dempués
qué hacienda tengo y qué años,
de dónde soy natural,
y luego cómo me llamo,
y que le haga un buen vestido.
para o dia do noivado.
E não é este todo o recado?
¿No es esto?
SUSANA
                      Sí, sí.
ZAPATERO
                           ¡Mal ajo,
que se me abrió tanto oído!
SUSANA
Assim é, ficai com Deos,
SUSANA
que eu vou-me a casa entretanto.
Vá-se.
A Dios, que ella está esperando.
Vase.
SAPATEIRO
Verão a facilidade
com que lhe falo em entrando.
Sempre foi bom o aviso
por não errar o recado.
Sai Joana.
ZAPATERO
Verán la facilidad
con que respondo en entrando.
Gran cosa fue el avisarme
para no poder errallo.
Sale Juana y le hace cortesías.
JOANA
Sem dúvida este é o noivo.
É muito bem estirado,
bem tirado das canelas,
seja Deos sempre louvado.
JUANA (aparte)
Este sin duda es el novio;
no me parece muy malo.
ZAPATERO
Ya sin duda habló conmigo,
porque meneó los labios;
pero ¿qué fue lo primero
que había de entrar hablando?
JUANA (aparte)
No tiene mala presencia.
SAPATEIRO
Vossa mercê tenha as mesmas
e me viva muitos anos.
ZAPATERO
Ansina, ya me he acordado.
Muy buenas las tenga usté
y viva usté muchos años
por el favor.
JOANA
Ainda lhe não falei
já responde adiantado,
seria equivocação.
JUANA
               ¡Ay, señores!
¿Pues hele dicho yo algo
para que así me responda?
SAPATEIRO
Isso estava eu ajustando,
pessuo um pomar de Espinho,
lá no Terreiro do Paço
um olival e ũa vinha
bem no Adro de S. Paulo,
tenho sete réis e meio
a juro de seis e guardo,
pratos terei quatro dúzias
em bom uso, mas quebrados.
ZAPATERO
Eso estaba yo ajustando:
tendré en muebles y raíces
hasta más de dos ducados,
porque tengo yo un majuelo
que le tenían tasado
en más de noventa reales;
es verdad no vale tanto,
porque está ya de tal data
que le habemos descepado.
JOANA
A que prepósito agora
fala nisto este fidalgo?
JUANA
¿Y a qué propósito ahora
me sale con eso, hermano?
SAPATEIRO
Até aqui bem vai isto,
bizarramente escapo,
ela é mea inocente,
e que fora algum diabo
ZAPATERO (aparte)
Hasta ahora bueno va,
bravamente se la entrampo,
porque ella es medio inocente,
pero aunque ella fuera un diablo
como havia conhecer-me
respondendo tanto a caso?
¿cómo había de conocello,
respondiendo tan al caso?
JOANA
Senhor, que homem é este?
JUANA (aparte)
Señores, ¿qué hombre es aqueste?
SAPATEIRO
A isso vou. Nasci no ano
em que a fresca primavera
teve o seu princípio, em Maio,
quinze até setenta anos
tenha eu por esta conta.
ZAPATERO
A eso voy: Yo nací el año
de setenta y ocho o cinco,
y hasta setenta en que estamos,
tengo yo, según mi cuenta,
entre doce y cuarenta años,
y aquestos los cumplo siempre
allá en el mes de los gatos.
Porque mire usté: mi padre
era su mercé escribano
y como en el mes de enero
suelen andar por tejados,
se enquillotró con mi madre,
que era doña Ana Collazos,
muy naturales de Colcos,
parientes de los lagartos;
y viniendo a echar la cuenta,
yo vine a nacer en marzo.
JOANA
Este homem é surdo ou louco,
se vai por este caminho
desfarei todo o contrato.
JUANA
Este hombre ¿es sordo o loco
o él está dado a los diablos?
Pues si habláis de aquese modo,
se deshará lo tratado.
SAPATEIRO
Fidalgo sou como el rei,
fui nascido no grão Cairo,
donde o solar de meu pai,
não falando nos sapatos,
é muito bem conhecido,
e morreram alguns queimados,
pervalecem hoje seus nomes
em ũa igreja estampados.
ZAPATERO
Eso, hidalgo como el rey,
que nací donde he nombrado,
donde el solar de mis padres,
no hablo ahora de zapatos,
es tan conocido que,
aunque murieron quemados,
hoy permanecen sus nombres
en una iglesia estampados.
JOANA
Tenho entendido que é surdo.
Não quero já tal noivado.
JUANA (aparte)
Él es sordo, no hay que andar,
¡buen lance habemos echado!
Hombre, queda ya advertido:
no hay nada de lo tratado.
SAPATEIRO
Meu nome é Brás de Paredes
Pinheiro Mendes Carvalho
e destes quatro apelidos
pessuo quatro morgados.
ZAPATERO
Mire usté: en cuanto al vestido,
si vendo muchos zapatos…
JOANA
Senhores, tenho entendido
que em casamento não falo.
JUANA
Pues ¿quién te pide vestido,
salvaje, que ya me enfado?
SAPATEIRO
Juro-lhe que farei vestido,
mas que seja de retalhos.
ZAPATERO
Yo soy el que gano en ello:
esta, señora, es mi mano.
JOANA
Há bruto, simples como este?
Este homem é insensato,
JUANA (aparte)
¿Hay simplonazo como este?
Hombre o maza, ¿estás borracho?
ZAPATERO
Yo no sé, mas la comadre
dijo que yo era muchacho.
fazes de mim zombaria,
dize, louco, mentecapto?
JUANA
¡Aparta!  ¿Búrlaste de mí,
simple, loco, mentecato?
Húyese y anda tras ella.
SAPATEIRO
Esse favor vos quero pagar
com dar-vos aqui um abraço.
Abraça.
ZAPATERO
Ese favor pagar quiero
con daros aquí un abrazo.
JOANA
Acuda-me, minha tia,
JUANA
¡Tía mía!
livre-me deste magano.
Sai Susana, falando à parte.
Da voces y sale Susana.
SUSANA
        ¿Qué hay, sobrina?
JUANA
Libradme deste pelmazo.
SUSANA
Sem dúvida tudo errou
quanto lhe havia ensinado.
SUSANA
Sin duda lo ha errado todo.
(para ele)
Como está isto, sobrinho?
JUANA
Usté, tía, me ha engañado.
SUSANA
Pues ¿qué habéis hecho, tontón?
SAPATEIRO
Corrente como água em charco.
ZAPATERO
Yo por mí aquesta es mi mano.
JOANA
Minha tia, esteja certa
JUANA
Tía mía, tía mía,
que com tal home não caso.
él es sordo; no me caso.
SUSANA
Se isto é já tão público,
como quereis remediá-lo?
Saem o Cura e Velho.
SUSANA
Si aquesto es público ya,
¿cómo puedes remediarlo?
Salen el sacristán y el vejete y hácenla cortesías.
CURA
Parabém sejam tais noivos
e se logrem muitos anos
e todos de tanta dita,
é certo que nos alegramos.
SACRISTÁN
Dios sea en aquesta casa
y sea por muchos años,
que de vuestra dicha todos
es cierto nos alegramos.
JOANA
Oh, que ditosa de mim!
JUANA
¡Ay, desdichada de mí!
SAPATEIRO
Que tendes, meu bem adorado?
SUSANA
Que tendes, sobrinha adorada?
Não façais nisto reparo.
SUSANA
Sobrina, no hagas reparo.
VELHO
Em mil anos vos logreis
VEJETE
Y mil años la gocéis.
com mimo, amor e regalo.
ZAPATERO
Pues aún no están acabados,
porque con aquesta boda
hemos arrimado el banco.
VELHO e CURA
Parabém seja, senhora.
JOANA
Eu de tal não faço caso.
LOS DOS
Juana, sea en hora buena.
CURA
Dai a mão ao desposado
SUSANA
Sobrina, dale la mano
e dai-lha vós, homem, também.
y dádsela vos también.
JOANA
Grande bem é que alcanço
com tal marido casar!
É bem valente madraço.
JUANA
¡Buen lance habemos echado
con tal marido!
ZAPATERO
                       Sí, quiero.
CURA
Ponde-vos dessoutro lado.
Eu vos ajunto e recebo
pelo poder que em mim acho.
SUSANA
Poneos a estotro lado
y da señas.
VELHO
Ora, já estão recebidos,
festejemos o noivado.
ZAPATERO
           Sí recibo.
SUSANA
Él es un tontón y un macho.
ZAPATERO
Sí, otorgo.
JUANA
          Él es un borrico.
ZAPATERO
Sí, señora; esta es mi mano.
SACRISTÁN y VEJETE
Pues celebremos la fiesta
todos bailando y cantando.
Cantan.
CURA
Eu por mim sou o primeiro.
TODOS
Vamos tangendo e bailando.
Canta o VELHO
Já que ‘tamos de baile digamos tudo.
Joana está casada com um homem surdo.
CURA (canta)
Ainda que é surdo
sempre a molher anima
e não é sapateiro de obra-prima.
JOANA
Hão-de ver grande fruto
deste noivado
já que com homem surdo
me tem casado.
SAPATEIRO (canta)
Bem sei, minha molher,
que estais casada,
bom proveito nos faça
a sovelada.
Canta SUSANA
Aqui do surdo acaba
todo o processo
e todos perdão pedem
ao congresso.
SACRISTÁN y VEJETE
Con un sordo casamos
hoy a Juanilla.
SUSANAy SACRISTÁN
Y el dote que la damos
es la banquilla.
SACRISTÁN y VEJETE
Zapatero es el novio,
no de obra prima,
y demás de ser sordo,
tiene gran giba.
JUANA
Dígame, mi marido,
si bien me quiere.
ZAPATERO
Cumplo los años, niña,
a veinte y nueve.
JUANA
Bien conoces, mi vida,
que estás casado.
ZAPATERO
Juro a Dios que aún me duele
el alesnazo.
SUSANA
Démosle fin al baile,
si te parece.
VEJETE
Aunque no tiene cepas,
bien vale veinte.